11.04.19
Estrada!
Rui Pereira
De repente, sou assaltado por pensamentos que me afligem, como que por uma impulsão masoquista. Apoquentado, faço por me libertar e tento concentrar-me na pedalada.
Sinto o peso da inclinação da via nas pernas e socorro-me do manípulo direito para levar a corrente para uma posição superior. Um toque. Dois toques. Dou ainda um terceiro à procura daquele conforto que tardava em chegar.
A respiração ofegante faz-me erguer a cabeça…
Assim que olho em frente, numa autocensura instantânea, solto para dentro:
– Deixa-te de merdas e aproveita!
O cenário que envolve a tira de asfalto onde me desloco é único!
Árvores de folha caduca, com os seus ramos despidos a ondular ao vento, marcam o fim da estrada, mas também o princípio de verdes pastagens de erva viçosa. Lá mais ao fundo, o verde ganha outra tonalidade. As volumosas árvores, ao contrário das primeiras, mantêm toda a sua integridade. Num último patamar, as imponentes montanhas deixam-se vislumbrar por entre a neblina. Tudo isso envolto num sereno ambiente sonoro, entre o canto dos pássaros e o peculiar som da vegetação, ao ritmo da ligeira e fresca brisa que se faz sentir.
Pedalar numa estrada onde nos é permitido usufruir desta ambiência é um privilégio. E nem sempre valorizamos isso. Seja pelo hábito e por a darmos por algo adquirido, seja por levarmos demasiada bagagem na mente. Ou simplesmente porque temos o foco no destino e esta estrada, e respetivo cenário circundante, não serem mais do que um meio para atingir o fim.
Deixo as aflições que me assombravam a mente. Esqueço as dores associadas ao esforço físico. Às vezes, basta tão pouco para nos sentirmos bem. Uma bicicleta, uma estrada… e toda a sua envolvência!